sábado, 16 de maio de 2009

"Guru"


"O adeus ao guru "



Augusto Pontes: referência para a cena cultural do Estado, do Pessoal do Ceará à Massafeira Livre (Foto: ANDRÉ LIMA/29.12.2005)
Fortaleza se despediu ontem de Augusto Pontes, filósofo, compositor, publicitário, ex-secretário de Cultura do Estado. Acima de tudo, um grande agitador cultural, capaz de costurar em torno de si artistas das personalidades mais distintas, atraídos pela inteligência inquieta e pela sempre-ironia que o fizeram guru de várias gerações.Quando a mesa cresce, a cultura desaparece. A frase ecoa desde os tempos de Bar do Anísio, na Beira-mar da Fortaleza dos anos 60. Em tom espirituoso, bem à cearense, integra a extensa lista de tiradas de um intelectual que sempre cuidou de unir as letras à boemia. Paradoxalmente, em desacordo com a própria assertiva, os muitos amigos que na manhã de ontem se despediram de Francisco Augusto Pontes tinham em comum a lembrança de uma pessoa absolutamente gregária. Capaz de apaziguar interesses divergentes e egos inflados, reunindo à mesma mesa - ou na mesma produção cultural - artistas de diferentes linguagens, propostas, universos. Todos envoltos pela inteligência provocativa, mas também acolhedora, do guru da geração do Pessoal do Ceará. E de outras que a sucederam.Na efervescência dos pátios universitários, nas primeiras canções do Pessoal nos bares e programas de TV, na diáspora Brasil afora da geração de Fagner, Belchior, Ednardo, Téti, Rodger, Fausto Nilo, entre outros talentos, no renovado burburinho na Massafeira Livre, promovida há 30 anos, na contribuição ao desenvolvimento da publicidade local, Augusto Pontes deixou sua marca no cenário cultural cearense. Um impacto estendido ao longo de décadas, em contraste com o curto período em que respondeu formalmente pela Secretaria de Cultura do Governo do Estado, no início dos anos 90. Uma influência de quem, longe de enfileirar livros publicados e lançamentos em clubes sociais, se fez referência para os círculos intelectuais. Nos versos de suas canções, na ousadia de seus projetos, nos detalhes peculiares de suas leituras da realidade, no magnetismo instigante de sua convivência.Pois o guru, nascido aos 30 de dezembro de 1935, achou de se despedir na manhã de ontem. De acordo com relatos de familiares e amigos que compartilharam os últimos dias do inquieto agitador cultural, Augusto partiu às 4h35 da manhã, no Hospital São Mateus, onde estava internado desde quarta-feira. Amigos que acolheram o compositor e o ajudaram na condução ao hospital relataram uma suspeita inicial de dengue, mais tarde descartada, segundo a família. De acordo com parentes, o falecimento veio em decorrência de uma hepatite medicamentosa aguda, seguida por falência múltipla de órgãos. O sepultamento acontece hoje, às 10h, no Cemitério São João Batista. O publicitário cearense deixou quatro filhas: Clarissa, Cecília, Natércia e Isadora.Mostrando-se surpresos, entre depoimentos de recentes momentos divididos com Augusto, amigos de arte e de trajetória se solidarizavam na manhã de ontem, no velório realizado em uma funerária na Aldeota. Clodoveu Arruda, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), acompanhou de perto os últimos dias de Augusto, contando tê-lo auxiliado, ao lado de amigos como os compositores Rodger Rogério e Fausto Nilo, o publicitário Fernando Costa e o gestor público Arialdo Pinho.´Liguei pro Augusto quarta-feira, e ele não atendia. Fui lá e encontrei ele caído no chão. A cena era terrível! Chamei o Rodger e o João Batista Marinho, médico e amigo, que o examinou e disse que o Augusto tinha que ser internado imediatamente´, relatou Clodoveu, citando que a partir da internação, na tarde de quarta-feira, Augusto recebeu todos os cuidados devidos. ´Era uma pessoa muito inteligente, muito generosa. Um grande amigo´, ressaltou, destacando ainda a homenagem prestada com a Escola de Comunicação, Ofícios e Artes Francisco Augusto Pontes, a Ecoa, no município de Sobral.Comprovando a influência de Augusto sobre várias gerações, o músico e professor Pedro Rogério, filho de Rodger, era outro dos que dividiam recordações. ´Além de ser uma referência, Augusto era uma pessoa extremamente generosa, sempre. Em todos os momentos do meu livro sobre o Pessoal do Ceará, desde a dissertação, os debates, ele esteve presente. Sabendo da dimensão, da importância da figura dele, essa generosidade sempre me chamou a atenção´.
DALWTON MOURA
Diario do Nordeste . 15\052009 (sabádo)

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